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Lições portuguesas

  • Foto do escritor: Daia Roldão
    Daia Roldão
  • há 3 dias
  • 3 min de leitura

Foto - Filipe Amorim / AFP
Foto - Filipe Amorim / AFP

Eleições e política não são sinônimas, muito menos são irmãos siameses. Nem sempre os resultados eleitorais expressam diretamente as razões da política. Este pode ser o caso das eleições parlamentares nacionais de Portugal, realizadas no último domingo (18).


Ainda faltando apurar pouquíssimos votos, esses vindos das comunidades portuguesas no exterior, o vitorioso eleitoral inconteste é o PSD e sua Aliança Democrática de centro-direita. A aliança eleitoral do Primeiro Ministro conservador de direita, Luís Montenegro, conquistou quase 33% das cadeiras do Parlamento. Mesmo sem maioria absoluta, o PSD/AD adquiriu a primazia para a formação do novo governo.


Este foi o caminho do resultado eleitoral. Mas há que se conceder a verdadeira importância das relações políticas, por conceito, uma dimensão mais ampla que os resultados eleitorais. Nesta esfera – da política – a grande vitoriosa é a extrema direita portuguesa, articulada no Chega, do reacionário e neofascista André Ventura.


A vitória política que pavimentou o caminho do crescimento eleitoral – o Chega cresceu de um solitário deputado eleito em 2019 para 58 em 2025 – foi se construindo em todo o processo político. A votação recebida pelo Chega não é muito maior do que a recebida nas eleições de 2024, quando elegeu 50 deputados.


O maior capital político do partido da extrema direita, no entanto, é que estes resultados são a expressão de uma validação da política do Chega, uma aceitação cada vez maior de seu programa anti-imigração e xenófobo. De explicações simples, erradas de construção de culpados e de apresentação de solução, mas com alta capacidade mobilizatória, esta narrativa atraiu setores populares descontentes e setores empresariais interessados em um programa neoliberal mais radicalizado e agudo. O Chega, mesmo sem ser a maior bancada do Parlamento, é a mais influente e apresenta a maior capacidade de determinar a agenda e a pauta do debate político.


A retórica reacionária do Chega impacta de um modo tão contundente a formação da opinião pública que arrastou a própria base do centro direita e da social-democracia para posições de direita extremada. Situação que apresenta pontos de contato com o Brasil.

O futuro não é de otimismo. Independente de compor ou não o governo junto com o PSD/AD, formou-se uma maioria reacionária e de direita sólida no Parlamento Português. O que apresenta, possivelmente, um cenário de alterações, em profusão, da Constituição Nacional, naquilo que ainda tem dos ideais de Abril. Abrindo o caminho para a “limpeza” dos conteúdos sociais-democratas e de esquerda ainda presentes no texto constitucional português, tais como a privatização do sistema público de saúde, e axiomas e conceitos distributivistas.


O Partido Socialista, e talvez a própria centro-direita, não compreendeu o risco iminente do crescimento da extrema direita. Não soube ler o cenário global e local. Errou ao desconstituir a Geringonça, aliança à esquerda que mantinha com o Bloco de Esquerda e com o Partido Comunista. No que parece ter sido seguido pelo próprio Luís Montenegro, quando forçou novas eleições pensando em obter maioria sozinho. Novas eleições, incapacidade de responder questões chaves como habitação e dubiedade sobre a guerra da Ucrânia, só interessavam a quem pretendia tomar a ofensiva ideológica e política. No caso o Chega.


O leite está derramado. Será preciso uma revisão de estratégia do Partido Socialista, o maior partido à esquerda, em sentindo de reconhecer as dificuldades e reorganizar um novo bloco democrático e progressista em Portugal. Sob pena de, em tempo tão distante, fotografias de Salazar reaparecerem nas janelas dos velhos casarões da burguesia.



*Este é um artigo de opinião publicado no site Brasil de Fato.


Editado por: Vivian Virissimo

 
 
 

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